Bruno Simões, especialista em TI, com Mary e os filhos, Helena e Pedro
TROCA DE ENDEREÇO
‘Passamos a primeira parte da quarentena em um apartamento em São Paulo. A sensação era de aprisionamento. Decidimos então ficar o resto do isolamento em Jundiaí, no interior. As crianças se adaptaram rapidamente e começaram a interagir com a natureza. Se agora falamos em voltar para nosso endereço antigo, elas protestam. Nosso trabalho ainda está na capital, então teremos que viajar bastante quando tudo isso passar, mesmo assim sabemos que valerá a pena, e o home office será fundamental. Estamos mais calmos e tranquilos.’
Não há, ainda, levantamento estatístico que ampare a mudança de comportamento, mas existem indícios palpáveis de que algo trincou e precisa ser colado. Houve, por exemplo, inédito aumento de buscas no Google pelo termo ‘meditação’ – 43% em abril em comparação com dezembro de 2019, o maior índice em dezesseis anos de levantamento. Uma das maiores imobiliárias de São Paulo, a Lello, que atende as classes média e alta, identificou salto de 40% de interesse por casas amplas com cômodos para home office. Apartamentos em bairros badalados, próximos a lugares repletos de serviços, bares e supermercados, tornaram-se desinteressantes. Endereços mais amplos e perto de áreas verdes são os preferidos agora. ‘As residências se transformaram em santuários protegidos’, afirma Stefano Arpassy, da consultoria de tendências WGSN Management. Há, portanto, uma guinada como não se via fazia décadas, desde que a falta de segurança e a criminalidade empurraram a sociedade para condomínios de apartamentos
Há, portanto, uma guinada como não se via fazia décadas, desde que a falta de segurança e a criminalidade empurraram a sociedade para condomínios de apartamentos e shopping centers. Diz a psicóloga Patricia Bader, da Rede D’Or: ‘Muitas vezes estamos em um modo automático tão profundo que esquecemos o que é de fato relevante para nossa existência’. Olha-se ao redor, veem-se as estatísticas, com esperança de melhora depois dos momentos mais dramáticos do surto, apesar do vaivém, e um caminho parece inevitável: o da adaptação, em todos os movimentos diários.
Poucos aspectos do cotidiano sofreram uma ruptura tão decisiva quanto o mundo do trabalho, de mãos dadas com o das escolas, de crianças em casa. Pais e mães trabalhando, filhos tentando estudar, tudo junto e misturado, o inevitável frenesi caseiro – e, como eventual subproduto dessa nova dinâmica, um aumento de 18,7% no número de divórcios no Brasil em junho, na comparação com o mês anterior. Fazer o quê? O home office ganhou tração, é compulsório, em seus diversos modelos, e dele sairemos diferentes. O que se ensaia nas empresas é uma movimentação quase tão estrondosa quanto a da Revolução Industrial, mas às avessas, com milhões de trabalhadores voltando para seus lares. Uma pesquisa realizada pela Fundação Instituto de Administração (FIA), de São Paulo, com quase 140 empresas brasileiras em abril deste ano mostrou que 46% delas adotaram o sistema de atividades domésticas durante a pandemia. E, claro, brotaram dificuldades que, se não são intransponíveis, podem ser bem chatas.
Fonte: https://veja.abril.com.br/saude/o-impacto-da-pandemia-nas-decisoes-do-cotidiano-que-vem-por-ai/